Quem pode negar saber que o açúcar engorda e seu excesso leva a obesidade? E quem nunca ouviu as falas: “um docinho não mata, não!”, “minha mãe me dava coca – cola na mamadeira e estou viva até hoje!”, “coitada da criança! Ela está com vontade! Você vai mesmo negar um docinho a ela?”
Cheias de boas intenções, estas frases são ditas na certeza de quem viveu os prazeres destas situações e, até o presente momento, acredita não ter sofrido qualquer consequência. E aí começam os perigos.
Quando nos deparamos com adultos que sofrem infarto, raramente culparemos o docinho que foi introduzido na infância. Seja aquele infarto que mata rapidamente, não dando tempo sequer para a família entender o que aconteceu – em sua maioria pessoas jovens, que ainda tinham muito o que viver- ou seja aquele infarto que traz muito sofrimento e angústia em suas visitas, limitando e matando aos poucos os sonhos e a vida, dificilmente lembraremos da sementinha do hábito do açúcar e de alimentos ricos em calorias, vazias de nutrientes e ingenuamente repletos de amor.
Quando convivemos com alguém que sofreu um derrame cerebral e hoje não consegue se alimentar sozinho ou apresenta uma fala arrastada/ininteligível, que apresenta sua mobilidade comprometida e sua independência tolhida não correlacionamos com a bolacha recheada que a avó carinhosamente estocou em casa para a chegada de seus netos.
Quando ouvimos falar de fígado gorduroso, colecistite, osteoartrite somos surpreendidos ao se referirem a adolescente ao invés de apenas em pessoas mais velhas.
Quando o médico lhe explica que seu filho apresenta pernas tortas, deslizamento da cabeça do fêmur (osso da perna que faz função com o quadril) , estrias de pele, puberdade precoce (quando a menina ou menino ficam mocinhos antes do tempo, causando entre tantos outros problemas baixa estatura, aumento de mamas, testículos, pênis e pelos antes que a criança esteja preparada para compreender todas estas mudanças em seu corpo, mudando a forma como passa a ser vista (de criança a adulto- apesar de ainda brincar de carrinhos e bonecas) quem se lembra do Danoninho dado ainda no cadeirão de alimentação com pequenas colheres de plástico coloridas?
Quando o adolescente sofre de baixa auto-estima, bullying, ou até mesmo depressão quem culpará o suco de caixinha presente diariamente dentro das lancheiras? Ou do chocolate que adoça o recreio? Ou das balas compartilhas na sala de aula?
Quando um ente querido começa definhar diante de nossos olhos vítimas de câncer de mama, câncer de endométrio (útero) ou câncer de intestino quem irá se lembrar dos biscoitos doce ou salgadinho deliciosamente colocados em embalagens coloridas e com desenhos com pequenas letras no verso delatando que contém alto índice de gordura e sal?
Quem em sã consciência se lembra das horas de televisão, computador ou videogame, que tão facilmente substituíam as brincadeiras com bolas, cordas, ou bicicletas diante de alguém que precisou amputar o pé, ficou cego ou perdeu as funções dos rins devido ao diabetes?
A Medicina atual, baseada em diversos estudos pelo o mundo a fora, não apenas nos lembra como também nos alerta: apesar de há pouco tempo atrás o bebê gordinho ser sinônimo de saúde, hoje se sabe que um bebê ou pré-adolescente obeso tem chances muito maiores de se tornar um adulto obeso. E que uma distribuição de gordura com predomínio abdominal é associada a chamada Síndrome Metabólica – associação de obesidade, tendência ao Diabetes, alteração de colesterol e triglicérides no sangue e pressão alta. Uma grande parcela das crianças obesas já apresenta esta síndrome a partir dos dois anos de idade, e possivelmente antes.
O grande problema da síndrome metabólica é ser causadora de doenças cardiovasculares. O grande problema de quando criticamos uma mãe que amamenta seu filho ao seio e/ou que pula como uma leoa na frente de qualquer um que ofereça um pirulito ao seu filho com menos de 2 anos é que gestos de amor em forma de doces, repleto de açúcar, ofertados de forma tão precoce e tão frequente, levam a obesidade e a todo o sofrimento descrito acima.
Não há nada de errado em dar doce às crianças, desde que se saiba que seu excesso e frequência trazem consequência para uma vida toda.
Dra.Ana Fonseca
CRM 163450. PEDIATRA – RQE n 60813.
Diretora clínica da SOROPED
Faça um comentário