Lembro-me, como se fosse hoje, de minha prepotência e arrogância quando surgiu o projeto do primeiro filho. Quanta ingenuidade em acreditar que 10 anos de estudo (entre Faculdade de Medicina e Especialização em Pediatria) garantiriam uma maternidade tranquila, controlada. Lembro-me daquele sorriso no canto da boca diante dos dois tracinhos no teste rápido de gravidez: mais facilidade impossível! Detentora dos conhecimentos da área, trabalhando há 6 anos exclusiva e integramente com crianças, conduzindo casos simples a complexos, lidando com doenças curáveis, ditas “bobas”, com doenças que deixam sequelas, representam risco de morte ou até mesmo doenças terminais. Sabendo todos os fatores predisponentes e fatores de risco. Tendo na ponta da língua todos os manuais para mães ou bíblias de bebês. Tendo o privilégio de cuidar de crianças desde a sala de parto até a adolescência. Que desafio a maternidade poderia me trazer?
Olhando para trás, parece que foi em outra vida aquela incapacidade de compreender tanto medo, angústia, desespero, e dúvidas desencadeadas por uma “simples febre “de 37.8C, “nariz escorrendo”, “choro”, ou “noite mal dormida”.

Lembro-me, como se fosse hoje, a incompreensão diante de tanto gasto de energia em situações de fácil resolução, baixo risco e cômodo tratamento. Chegava ao cúmulo de acreditar que tudo isso era causado simples e puramente por sobrecarga de funções (casa, trabalho, maternidade, família, estudos entre outras) ou falta de uma rede de apoio eficiente (qual a dificuldade em deixar a criança ser cuidada por outra pessoa, sendo de confiança, enquanto a mãe se dedica por horas, dias ou semanas a outra função/ papel? Seria a benção do desconhecimento de doenças graves e problemas “reais”? Qual exatamente era a dificuldade em se manter uma criança alimentada e limpa?
Antecipando cada mudança no corpo durante a gestação, prevendo cada necessidade e etapa, trazendo resultado de exames já prontos a cada consulta na rotina de pré-natal. Trabalhando como se não houve gravidez, curtindo a gravidez como se não houvesse trabalho. Cada chute era compartilhado com as mães no consultório, cada enjoo era prontamente reconhecido por elas, a cada ida ao banheiro (e como são frequentes a vontade de fazer xixi no final da gestação!) olhares compreensivos vindos da recepção me acolhiam neste momento é que tão nosso. Momento em que podemos gerar uma vida em nosso ventre: um milagre que só quem é mãe é capaz de entender.
De repente, chega aos meus braços um tico de gente, de 2.900 g, exatamente com 37 semanas de gestação (e nem um dia a mais), provando-me como estava errada em absolutamente tudo, reescrevendo meus 29 anos de história e me apontando como nada daquilo importava. Nenhum estudo nos prepara para a maternidade, assim como nenhum livro contém a vida.
SOROPED veio de um sonho de unir o que é constantemente segmentado, veio da descoberta de uma mãe frente aos desafios da maternidade. Veio da constatação de como a saúde, a criação e a educação dos filhos vão além do consultório. Veio da experiência de como uma mãe, em um ambiente acolhedor e direcionado, pode somar, compartilhar e se auxiliar nos altos e baixos desta nossa jornada, em cada fase do desenvolvimento dos filhos, e, por que não dizer, dos pais. Veio do sentir na pele que, verdadeiramente, “é preciso uma aldeia inteira para educar uma criança”.
Grata por fazer parte desta equipe, e extremamente feliz em abrir este canal de comunicação e este maravilhoso local para a nossa aldeia. Juntas crescemos e com eles aprendemos desde o primeiro positivo no teste de urina. Sejam muito bem-vindas ao nosso espaço www.soroped.com.br/papodemae. Sejam bem-vindas ao nosso blog especializado, construído para troca de informações e de experiências.

Lembramos apenas que, de forma alguma, este espaço substitui uma consulta médica. Para diagnósticos e tratamentos, faz-se necessário uma anamnese direcionada, exame físico e, algumas vezes, exames laboratoriais. A investigação diagnóstica é impossível de ser feita à distância e através de dados superficiais.

Do mesmo modo, não possuímos a pretensão infantilizada e simplista de dicotomizar entre certo e errado, ou bom e mau. Apenas muni-las de informações para que sejam feitas escolhas conscientes dentro do seu tipo de maternagem.

Por fim, convido-as a fazer esta viagem juntas, preservando a liberdade de levar em consideração apenas o que seja útil ou possa nos Cardiologyapoiar. O intuito é gerar mais perguntas, criar espaços de encontro, de comunicação e de solidariedade entre as mulheres. Permitamos que as portas que não nos sirvam sigam seu caminho, sem nos distrair, ou atrasar.

Dra. Ana Fonseca
CRM 163450. PEDIATRA – RQE n 60813.
Diretora clínica da SOROPED